segunda-feira, 31 de março de 2008

VIDA DE JESUS

Socorro Santana

Um dia
Maria
Levando ao colo virginal e puro,
Jesus infante que de olhar sereno
Sorria, complacente às criaturas,
Com um sorriso puro, terno, ameno!
No templo santo apresentado então,
Dando um alívio a todas amarguras
Com inocência e com clemência
Ao rude e torturado coração!

Simeão
Então
Tomando-lhe nos braços enrugados,
Em transporte de amor e de alegria,
A afagar-lhe a loura cabecinha
A virgem Mãe revela a profecia:
“Uma espada de dor um dia ferirá
O vosso coração, senhora minha!

Pela rudeza
E a vileza
Da turba insana que o condenará”!

Jesus
Eterna Luz
Crescendo vai pregando a sã doutrina
Do Pai Celeste que domina o mundo!
Com milagres pasmando a humanidade
Que o rodeia com ardor profundo!
Pela fé que elege os corações
Banhados pela luz da caridade,

É aclamado
É proclamado
O mestre que conquista multidões!

É obediência
É complacência
O primeiro milagre que efetua:
Em Cana, às bodas convidado,
Com sua mãe que pede comovida,
Um milagre que seja antecipado!
A água então transforma em doce vinho
Para agradar à Sua Mãe querida!

É Jesus
Que conduz
Almas errantes ao reto caminho!

Ensinando
E pregando
Propaga o bem aos míseros mortais!
São milagres sem conta que semeia:
Multiplicando os pães sacia a fome
Da multidão fremente que O rodeia!
Dos possessos retira o germe imundo,
Para a grandeza do Seu santo nome!

É amor
O Penhor
Do Redentor e Salvador do mundo!

Fecundos
E profundos
São os prodígios do seu coração!
Ressuscitando o filho de Naim,
Curando cegos, mudos e aleijados,

Restituindo a Jairo a filha amada,
Salvando Madalena do pecado

Com ardor
O Salvador
Concede a paz à terra desolada!

Por amor
O Salvador
Visita a humilde casa de Betânia
Onde Lázaro seu amigo então jazia
Por três dias amargos torturados
Pranteado por Marta e por Maria!
Jesus ordena ao fétido mortal
Que se levante! E todos assombrados,

Vêem andar
E conversar
O moro que ressurge triunfal!

Jerusalém
Também
Aclama-O vibrante a delirar
Com “Hosanas ao Filho de David
Que vem bendito em nome do Senhor”
Jesus em meio a multidão sorri
Conhecedor da insana crueldade,
Causadora do erro e do torpor

Que germina
E que fulmina
Aquelas almas de grande maldade!

Bondoso
E caridoso
No Banquete Divino entre os apóstolos
Institui a Sagrada Eucaristia
Seu corpo e sangue dado em alimento,
É o milagre supremo que irradia!
Pelos séculos dos séculos seu amor
Oculto no Sacrário é o sustento

Que enobrece
E aquece
As almas que repousam no Senhor!

O vendaval
Do mal
Então já se aproxima:
Judas, o discípulo do Mestre traidor
Vende-O sem dó a Anaz e Caifaz,
Como um vil objeto sem valor!
Segue por fim o drama do Calvário!
O cordeiro imolado satisfaz

As paixões
Dos leões
Que tingiram de sangue o calendário!...

É açoitado
E arrastado
Levado de Herodes a Pilatos,
A suportar com alegria a Cruz,
Qual verme esmigalhado, lacerado,
Sofrendo afrontas o doce Jesus!
Ajudado por Simão o Cirineu,
Ao Calvário prossegue torturado!

É o Cordeiro
Com o madeiro
Dos pecados que o homem cometeu!

Desfalecido
E oprimido
Ao peso cruciante do madeiro,
Suor de sangue turva-lhe o olhar!
Chega então a Verônica piedosa
Que o santo suor põe-se a enxugar!
Um milagre é então presenciado:
No pano vê-se a face lacrimosa

Do Salvador
Que por amor
Aceita o sacrifício amargurado!

Crucificado
E lacerado
Entre ladrões padece cruelmente!
Com pragas e blasfêmias insultado,
Reclama ao Pai Celeste compaixão
Para o bárbaro feroz desnaturado!
Ao bom ladrão promete o Paraíso,
Com palavras de consolo e de perdão!

Com brandura
E ternura
Corresponde aos insultos com um sorriso!...

Na agonia
Vê Maria
Desfalecida, exangue ao pé da cruz,
Ao lado do discípulo que amou!
Dá-lhe por mãe a sua Mãe querida,
A quem ao seu amparo confiou!
“Tenho sede”! Exclama angustiado,
Com voz débil cansada e oprimida,

Sequioso
E desejoso
De morrer pelos homens desprezado!

Escurece
E enegrece
O sol, a terra, as águas e os montes!
Os mortos ressurgindo comparecem!
A terra treme e enche de terror
Os seres que de medo desfalecem!
Jesus expira! Está, pois consumado.
O mistério perenal do Seu amor!

Foi assim
Que por mim
Jesus morreu na Cruz abandonado!...

O VELHO CAJUEIRO

Socorro Santana

Era uma vez um velho cajueiro,
Implantado na mata,
Lá distante!...
Não mui frondoso,
Esguio, pequenino,
Entre muitos, no prado verdejante,
Bem distante da beira do caminho!

Aqui e além se viam espalhados
Inúmeros cajueiros carregados
De frutos amarelos, sazonados!
Outros vermelhos e apetitosos
Que de longe pareciam saborosos!

Um bando barulhento
Entra da mata à dentro
A procura do fruto suculento.
Cata daqui, dali, sempre provando
Os frutos, que aos montes encontrando,
Desagradam tão cedo ao paladar!
Uns tão ácidos e outros mui rançosos
Repugnando a quem lhes vai provar!

Andando,
Procurando,
Chegam por fim ao velho cajueiro
Mirrado! Porém muito carregado!
Experimentam pois: que sensação
Deliciosa e sem contestação!

Os frutos colhem:
Tantos que sobejam
A contentar a quantos os desejam!
Satisfeitos, alegres, vão embora
Deixando triste, abandonado agora
O velho cajueiro tão sozinho!
Esquecido na mata, desfolhado,
Tão renegado e longe do caminho!

xxx

Quantos talvez
Iguais ao cajueiro,
Florescem, frutificam e vicejam,
Dando sombra, dulçor, vitalidade
À farsante e ingrata humanidade:
E depois, tal qual o velho cajueiro
São banidos da glória e desprezados,
Sem piedade, dentro do espinheiro!

ILUSÕES DA VIDA

Socorro Santana

A vida é assim:
Um místico cenário!
O mundo: um palco
Por demais lendário,
De ato vil, efêmero e falsário!

Para uns é um drama divertido
Em risos e venturas
Convertido!
Para outros o triste desengano:
Fatalidades e trabalho insano!

Uns vivem mergulhados na opulência
Onde a frivolidade e a demência
Paralisam intelecto e coração!
Esquecendo do pobre, deserdado,
Envergonhado,
Mendigando o pão!

Outros, onde a glória lhes sobeja,
Não vêem no humilde
A insigne peleja
Da luta pela vida!
Só dão valor a quem não necessita
Deixando o pobre em mísera desdita!

Será que a mão de Deus
Inda castiga,
No outro palco da eternidade
O desterrado, o pobre que mendiga?
Não!...
Deus não pode ser assim desnaturado
Alheio ao sofrimento à dor fremente
Do pobre, sempre e sempre torturado!

E como foi por nós crucificado,
Deixando ao mundo as bem-aventuranças
Num consolo de paz e de esperança,
Resta esperar, a fé não desfalece!
Um novo ato ao pobre resplandece,
No palco perenal que não fenece!

CENAS DE RUA

Socorro Santana

Faz pena ver-se quase todo dia
De pernas estendidas na calçada,
O mendigo, exposto à zombaria
De quem passa correndo indiferente,
Á tétrica figura ali parada!

A uns estende a mão
Pedindo compungido
Uma esmola pelo amor de Deus!
E a súplica vazia não ouvida
È confundida nos lamentos seus!

Expondo aquelas pernas deformadas
Enormes ao poder do gigantismo
Na esperança que comova alguém!
Mas como sempre o indiferentismo,
O germe do mais torpe egoísmo,
Não comove ninguém!

E ele fica assim!
As pernas estendidas,
Enormes, deformadas, esquecidas,
Dias após dias na esperança,
Da mísera moeda que alguém lança!

Comércio vil de nojo e de miséria!
Macabra e hedionda exposição,
Que zomba dos poderes da ciência
Na iminência da deformação,
Que faz um ser humano transformar-se
A fazer disto o triste ganha-pão!

DEVANEIOS

Socorro Santana

Onde moro? Não sei! Vivo rolando
Nos declives sem fim de minha vida!
Se estou aqui um vácuo se interpõe,
Se fico lá me sinto entristecida!
E neste vai e vem que se repete
Fico sempre num beco sem saída!

Aqui meu grande amor deixo sozinho
No jugo da saudade e solidão!
Lá os filhos queridos que reclamam
Meu aconchego, minha proteção
E eu, nesta jornada vou sentindo,
Dilatar-se minh´alma e coração!

“Não sei se vou, não sei se fico!”
Digo tal qual ao Martinho da Vila
Na toada que hoje popular
Deleita-me bastante ao ouvi-la
E dela tiro conclusões propícias
A minha vida tosca e intranqüila!

Coloco meu dever além de tudo!
Além da música, além da poesia!
Ser mãe e ser esposa eis o meu prêmio
Que ouso conquistar feliz um dia,
Quando vir terminada esta jornada
De lutas, de martírio e de agonia!

E deste falso mundo de ilusões
Onde sonhei vencer no seu transporte,
Só levarei decepções frementes
Que culminaram sim a minha sorte,
Pois ao poeta cabe a triste sina:
Só ser glorificado após a morte!